No próximo dia 1 de Fevereiro de 2008 completam-se 100 anos sobre o assassinato do Rei D. Carlos I e do Príncipe D. Luis Filipe, no Terreiro do Paço.
Eu, que sou pela República e pelos seus valores, entendo que nós portugueses devemos reconhecer e honrar a memória daqueles que serviram Portugal devotamente e deram a vida pelo seu País, como D. Carlos e seu filho.
O Rei D. Carlos foi um estadista e um patriota, capaz de suportar a pressão dos momentos críticos e de tomar na altura própria as decisões em prol do melhor interesse nacional, segundo o que a sua consciência lhe ditava.
Numa brevíssima resenha, recorde-se que D. Carlos nasceu em Lisboa a 28 de Setembro de 1863, filho primogénito de D. Luís I e D. Maria Pia, que o baptizaram com o nome de Carlos Fernando Luís Maria Vítor Miguel Rafael Gabriel Gonzaga Xavier Francisco de Assis José Simão de Bragança Sabóia Bourbon Saxe-Coburgo Gota.
Quando D. Carlos ascendeu ao trono, em 1889, todos os olhos nele se concentraram, esperando que inaugurasse um período de verdadeira regeneração que superasse o estado em que o país se encontrava em virtude da ineficácia governativa dos dois partidos monárquicos que se alternavam no poder – o Partido Progressista e o Partido Regenerador.
Figuras prestigiadas do reino exortaram então D. Carlos a agir com firmeza e, se necessário, a exercer o poder pessoal dentro do que previa a Carta Constitucional. Por exemplo, António Enes, jornalista, escritor e homem de Estado, aludindo ao que se esperava do jovem monarca, aconselhou-o a preparar-se para o governo «como para uma luta entrecortada de incertezas e aventuras em que o afrontarão mais adversidades do que o ajudarão os favores das circunstâncias e serviços dos homens, de dia para dia mais acanhados de estatura e mais falsos e egoístas de coração.» E, como se pressentisse a tragédia futura, acrescentaria enfaticamente: — «Espera-se do reinado novo uma política nova que conserve o bom e corrija o mau da política velha: mas, por isso mesmo, o Senhor D. Carlos há-de sentir a coroa de ouro cravar-lhe espinhos na fronte e o manto pesar-lhe nos ombros com todo o enorme peso da ventura e da honra de um país que tão pouco faz da sua parte para ser venturoso e conservar-se honrado.»
Igualmente, o historiador Oliveira Martins aconselhou-o a corrigir o «indefinido sentimento de tédio e desconsolação que tem invadido muitos dos que melhores serviços podiam prestar ao seu país.»
Contudo, a situação política nacional evoluiu para a desagregação do sistema rotativo. Em Maio de 1906, por causa da mais que comprovada falência do rotativismo entre os partidos Regenerador e Progressista, D. Carlos escolheu João Franco para formar governo, dizendo-lhe na carta em que o convida:
«Há muito a fazer e temos, para bem do País, que seguir por caminho diferente daquele trilhado até hoje; para isso conto contigo e com a tua lealdade e dedicação, como tu podes contar com o meu auxílio e com toda a força que te devo dar.»
Mais tarde, numa entrevista ao jornal Le Temps, o Rei explicava:
«Caminhávamos não sei para onde. Foi então que dei a João Franco os meios de governar. Fala-se da sua ditadura, mas os outros partidos, os que mais gritam, pediram-me, também, a ditadura. Para a conceber, exigia garantias de firmeza. Precisava de uma vontade sem fraqueza para levar as minhas ideias a bom fim. João Franco foi o homem que eu desejava.»
João Franco aceita e não tarda a entrar em ditadura, dissolvendo-se o Parlamento em Abril de 1907, como única maneira entendida para lograr a normalização do país, numa altura em a que a ordem pública entrava em colapso.
Mas, perante a encarniçada oposição à ditadura de João Franco, que minava seriamente a ordem pública, o governo decidiu intensificar a repressão e preparou um decreto que autorizava a expulsão do país ou o degredo dos inculpados em crime contra a segurança do Estado. O Rei D. Carlos assinou o decreto em 31 de Janeiro de 1908, em Vila Viçosa, na véspera do seu regresso a Lisboa, tendo pronunciado então ao ministro da justiça a célebre frase premonitória: “Tenho o palpite de que, assinando este decreto, assino a minha sentença de morte, mas vocês assim o querem”.
Do epílogo reza a História. No dia seguinte, D. Carlos foi assassinada por balas terroristas, que também não pouparam o principe herdeiro D. Luis Filipe.
Ao longo do seu reinado, numa conjuntura internacional difícil e ameaçadora dos interesses e territórios portugueses, foi meritória a acção diplomática do Rei D. Carlos:
«Em D. Carlos onde as suas notáveis qualidades de espírito mais brilhantemente se afirmaram, vincando de forma perdurável uma acção diplomática fértil e resultados para o paiz, foi na política estrangeira do seu reinado e na acção pessoal coroada d’êxito, que desenvolveu, e nos creou uma situação internacional como nos últimos tempos, nem antes nem depois d’elle, Portugal jamais teve.» (João Franco, 1924)
D. Carlos foi um dos monarcas mais válidos e bem preparados do seu tempo: Reformador, diplomata, poeta, pintor, cientista, músico, tão multifacetado era o seu espírito que difícil se torna atribuir-lhe um cognome apenas.
A Comissão D. Carlos 100 anos, constituída sob o alto patrocínio da Fundação D. Manuel II, tem como objectivo evocar a vida e obra do Rei D. Carlos, quando passam 100 anos sobre a sua morte. Para o efeito, promove já no próximo dia 1 Fevereiro cerimónias evocativas do regicidio:
- 1 de Fevereiro, 17h
Homenagem ao Rei D. Carlos e ao Príncipe Real D. Luís Filipe
Local: Terreiro do Paço, esquina com Rua do Arsenal, Lisboa
Participação: Colégio Militar, Regimento de Lanceiros, Regimento da Artilharia Anti-aérea nº 1
Organização: Comissão «D. Carlos – 100 anos»
-1 de Fevereiro, 19h
Missa pelo Rei D. Carlos e pelo Príncipe Real D. Luís Filipe
Presidida por Sua Eminência, o Cardeal-Patriarca de Lisboa D. José Policarpo
Coro Stella Vitae
Local: Igreja de S.Vicente de Fora
Comissão «D. Carlos – 100 anos»
- 1 de Fevereiro, 20h
Tributo nos túmulos del Rei D. Carlos e do Príncipe Real D. Luís Filipe
Duques de Bragança, Cardeal-Patriarca de Lisboa, Ordens
Local: Panteão dos Braganças / Mosteiro de S. Vicente de Fora
- Fevereiro:
Lançamento do Concurso «D. Carlos», nos três ciclos do Ensino Secundário de todas as escolas do País
(contos, trabalhos de estudo e artes plásticas).
Colaboração: Marcelo Rebelo de Sousa e Rui Ramos
Comissão «D. Carlos – 100 anos»