"O sinal verde acendeu-se enfim, bruscamente os carros arrancaram, mas logo se notou que não tinham arrancado todos por igual. O primeiro da fila do meio está parado, deve haver ali um problema mecanico qualquer, o acelerador solto, a alavanca da caixa de velocidades que se encravou, ou uma avaria do sistema hidráulico, blocagem dos travões, falha do circuito eléctrico, se é que não se lhe acabou simplesmente a gasolina, não seria a primeira vez que se dava o caso. O novo ajuntamento de peões que está a formar-se nos passeios vê o condutor do automóvel imobilizado a esbracejar por trás do pára-brisas, enquanto os carros atrás dele buzinam frenéticos. Alguns condutores já saltaram para a rua, dispostos a empurrar o automóvel empanado para onde não fique a estorvar o transito, batem furiosamente nos vidros fechados, o homem que está lá dentro vira a cabeça para eles, a um lado, a outro, vê-se que grita qualquer coisa, pelos movimentos da boca percebe-se que repete uma palavra, uma não, duas, assim é realmente, consoante se vai ficar a saber quando alguém, enfim, conseguir
abrir uma porta, Estou cego."
José Saramago, in "Ensaio Sobre a Cegueira"
E assim é, de facto; nada de importante ou maléfico aqui se deseja; bem antes pelo contrário; o que certamente se pode concluir é que o verdadeiro literato, brincalhão, autor de posts de tão elevado nível, deve andar tão ocupado e a falta de jeito para a condução deve ser tanta que o seu pópó foi abaixo há já uns mesitos e o seu Godot lá passou tranquilamente na passadeira e ninguém deu por ele; e atrás passou o primo, e depois o tio e a tia e a avó a agora deve estar a chegar a vez do filho do tio dele. Digo eu, que realmente fico espantado com tamanha ironia.
Continuo a achar que o Senhor Lincoln tinha razão. Às vezes é melhor estar calado...
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