Para o antigo ministro das Finanças, Portugal não vai conseguir escapar à actual recessão que afecta os países desenvolvidos. Ainda assim, a crise pode ter um lado positivo: a pedagogia da recuperação. É na recessão que se preparam as políticas para o período novo.
Jorge Braga de Macedo tem, no entanto, um receio: as eleições legislativas do próximo ano podem motivar uma paragem nas reformas, acabando numa discussão sobre os estilos dos candidatos.
Destaques da Entrevista hoje ao Diário Económico:
«A minha imagem pública foi marcada por ter dito em 1992, com licença poética, que a economia portuguesa podia escapar à recessão. Para explicar, recordo o verso de Fernando Pessoa:
Há um oásis no incerto;
É como uma suspeita;
De luz por não-há-frinchas;
Passa uma caravana .
Primeiro, a incerteza que havia naquela altura de uma recessão que chegou subitamente com o não dinamarquês ao tratado de Maastricht. Depois uma suspeita de luz por não-há-frinchas e uma caravana que passa, quer dizer: uma situação melhor do que as outras mas certamente não ideal. Aquela poesia tocou num ponto da psique portuguesa - que eu se calhar deveria ter antecipado que podia tornar-se motivo de chacota. Começaram a brincar com a parte turística, com a desertificação e os camelos. Parecia que não era preciso fazer nada, quando era exactamente o inverso: nas recessões é que se preparam as políticas e reformas para o período novo. »
«Por isso é tão relevante o actual momento. Há uma onda reformista neste Governo isso é indesmentível, mas é muita parra e pouca uva. São reformas que demoram tempo, por isso não se pode esperar mudanças imediatas. Mas às vezes temos dificuldade em medir resultados, até porque reformas adiadas durante 15 anos não podem ter resultados depois de três. E estamos a aproximar-nos de uma eleição. O que vai acontecer em 2009? Aprender numa recessão, tomar medidas, continuar como se devia ter feito na recessão anterior, ou, pelo contrário, parar, interromper as reformas porque agora há que ganhar as eleições?
Mas há reformas que só passam com convergência de posições dos partidos de governo, por isso chamadas bipartisan nos EUA. Nesse contexto, a recessão internacional pode ser uma oportunidade extraordinária para criar condições e aprofundar as reformas.»
«Mais grave do que as invasões napoleónicas e a guerra civil, mais grave do que as sucessivas revoluções do século XX, foi que, há trinta e poucos anos, a classe empresarial portuguesa levou uma grande marretada. Não se cria uma elite industrial de imediato e a exclusão do chamado old money durou até 1989. Voltamos à grande medida conjunta do PS e do PSD: a revisão constitucional que permitiu privatizar, mesmo na véspera da queda do muro de Berlim! Esta reforma estrutural foi seguida pela entrada no sistema monetário europeu e pela liberalização dos movimentos de capitais mas, depois, as reformas pararam.
Nos últimos trinta anos, não estamos no grupo dos recordes de crescimento mundial: foram 15 anos para decidir se era capitalista ou socialista, depois um breve intervalo para fazer reformas que ficaram incompletas, e mais 15 anos a pensar nas pessoas e a dizer que os números não interessavam .»
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